quarta-feira, 19 de novembro de 2014

Visto Gold, cidadão de excelência?

Ter um visto dourado é sinal de liberdade de circulação no espaço Schegen. Mas é também sinal da capacidade económica que levou à obtenção do visto.
Ou seja, existe uma desigualdade social entre aqueles que se podem dar ao luxo de “comprar” um visto dourado e os cidadãos que gostariam de ter esse privilégio mas não têm capacidade financeira para tal.

Genericamente, a politica dos vistos dourados não é muito diferente do conceito de paraísos fiscais: Sob um conjunto de pressupostos é possível a alguns cidadãos com capacidade financeira, adquirir um conjunto de direitos para obtenção de benefícios próprios.
Não se trata de serem melhores ou piores cidadãos mas sim terem mais ou menos dinheiro, numa segmentação económico-social que deixaria angustiado qualquer democrata defensor dos ideais da Revolução Francesa.
Liberdade, Igualdade e Fraternidade são cada vez mais valores vagos, economicamente desinteressantes e socialmente falaciosos!
Os vistos gold são um bom exemplo disso mesmo!


quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Não há ausentes sem culpas, nem presentes sem desculpas


Sob o pretexto de um qualquer estudo económico, numerosas medidas politicas têm sido tomadas em Portugal com impactos estruturais na vida de milhares de cidadãos e com alterações profundas no ordenamento do território. Não querendo colocar em causa a fiabilidade ou a veracidade dos estudos utilizados, nem sempre é possível agrupar num documento (e outras vezes é até pouco conveniente...) a total dimensão dos impactos económicos de uma determinada medida.
Deixo aqui exemplos de muitos similares disseminados por todo o país:
Com a Politica Agrícola Comum, a superfície agrícola explorada em Portugal reduziu cerca de 30% (em 1968 havia cerca de 5 milhões de hectares afectos à produção agrícola, número que reduziu para 3.5 milhões em 2007 – dados do Pordata). Pela lógica económica das vantagens competitivas, foi desincentivada a produção de pequenos e médios agricultores (muitas vezes através de subsídios) para que a produção cumprisse critérios de eficiência. Isso originou, entre outros, o abandono das terras, o aumento da superfície ardida e a fuga das populações para áreas do país industrializadas ou para outros países. Esse abandono das terras também ameaçou a produção de raças e culturas autóctones.
Outro exemplo são os serviços públicos como a educação e a saúde. Devido a critérios de eficiência, os governos decidiram fechar escolas e unidades de saúde em zonas do país que não cumprissem rácios estatísticos face à média nacional. Pelos dados do Pordata, em 1980 havia em Portugal cerca de 10.000 escolas do ensino básico e em 2013 não eram mais de 4.800. Já em relação às unidades de saúde, passámos de cerca de 460 em 1980 para 230 em 2012. Podíamos alegar que o número de camas de internamento tinha aumentado mas nem isso aconteceu. Em 1980 eram 51.000 e em 2012 não passavam de 36.000.
A concentração de serviços tinha como objectivo gerar economias de escala, poupando recursos ao orçamento do Estado. Essa concentração não teve em consideração os impactos das medidas como a perda de população no interior e a dificuldade em atrair profissionais qualificados para regiões em perca demográfica e com tendência para o subdesenvolvimento compulsivo.
Ou seja, os estudos económicos que protegeram decisões dos Governos, não consideraram as consequências das medidas apesar da Economia como ciência social não ignorar esses impacto: Externalidades e custos de oportunidade são conceitos amplamente estudados na teoria económica pela sua pertinência em qualquer decisão mas são igualmente incómodos quando podem afectar a lógica politico-partidária.

Com o abandono das terras ninguém parece ter pensado no que aconteceria aos terrenos nem aos agricultores depois dos subsídios. Com o fecho de escolas e unidades de saúde, ninguém se preocupou em definir políticas de fixação de populações e dinamização do tecido empresarial.
Há em Portugal uma crescente faixa de terreno esquecida e abandonada pelo poder central porque não produz, porque tem cada vez menos pessoas e porque isso significa menos votos. Os estudos económicos ignoraram que somos um pequeno país sem recursos minerais que não se pode dar ao luxo de abandonar mais de 50% do território para se concentrar apenas no litoral desenvolvido e populoso. Nem sempre a melhor decisão é a que parece ser mais eficiente no curto prazo.

Não se pode gerir um país no curto prazo apenas por estatísticas nem a economia pode ser a única justificação para todas as políticas estruturais de uma nação eficiente!