sexta-feira, 29 de julho de 2011

Ao melhor estilo do Fernando Pessa... E esta hein?

Uma semana após a cimeira europeia, ainda não é claro se as medidas acordadas pelos países membros da zona euro serão suficientes para acalmar os mercados (provavelmente não). No entanto há um consenso em relação a uma coisa, foi um passo na boa direcção. Três aspectos surgem como os mais importantes. Primeiro a redução do custo financeiro associado ao apoio prestado pelos restantes membros do euro aos países sem acesso normal aos mercados de dívida. Segundo, o reconhecimento que é necessário envolver os privados no exercício de reestruturação da dívida. E "last but not least" um compromisso para uma estratégia de crescimento para a zona euro.
Sim, porque é sem dúvida esse o elixir para estabilizar os mercados financeiros, um crescimento económico robusto e uniforme na zona euro! E é importante que todos os agentes de política económica contribuem para esse objectivo, incluindo o Banco Central Europeu... Ora, ao contrário dos seus congéneres nos EUA e na Inglaterra, o BCE iniciou uma trajectória de contracção monetária para combater a inflação. E apesar da contracção monetária, isto é o que aconteceu com os juros da dívida publica Alemã...
Isso mesmo, diminuíram! Ao melhor estilo do Fernando Pessa... E esta hein? É o mecanismo de transmissão monetária de pernas para o ar... E porquê?
Na minha opinião, uma possível explicação é a seguinte. A Europa precisa de crescimento. Uma política monetária contraccionária prejudica esse objectivo e contribui para a crise da dívida soberana nos países periféricos da zona euro. Isso conduz os investidores a comprar dívida Alemã num exercício de "flight to quality". E em resultado disso, as taxas de juro na Alemanha diminuem, contribuindo para o sobre aquecimento da sua economia. Conclusão, numa Europa de assimetrias, uma política monetária mais acomodativa pode simultâneamente contribuir para um crescimento mais uniforme na zona euro e ser consistente com o objectivo de estabilidade de preços, que é a missão do BCE.
Este é sem dúvida um momento interessante para pensar sobre economia!
Paulo S. Monteiro
smont.paulo@gmail.com (comentários bem vindos)

quinta-feira, 28 de julho de 2011

Ainda bem que é Agosto!

Agosto é o mês de férias por excelência para a maioria dos portugueses. A cidade de Lisboa fica vazia face ao fluxo migratório que ocorre nesta altura do ano. Uns vão para o estrangeiro, outros para o sul do país, outros, a quem a factura da despesa não permite estes luxos, deslocam-se até às praias mais próximas da cidade. É também por esta altura que as praias da Costa da Caparica se enchem de banhistas.

Em mais de seis anos de trabalho, nunca tirei férias em Agosto, porque é o melhor mês do ano para trabalhar. O telefone pouco ou nada toca, os emails reduzem-se substancialmente e a pilha de tarefas acumuladas ao longo do ano pode finalmente desaparecer de cima da minha secretária. No entanto, o que mais me seduz neste mês, de calor e sol intenso, são as filas de trânsito que, como por magia, simplesmente, desaparecem!
É precisamente neste contexto que sou levada a reflectir sobre a notícia, que abaixo transcrevo, relativa à reintrodução do pagamento de portagens na ponte 25 de Abril durante os meses de Agosto.

«O Orçamento do Estado para 2011 prevê a eliminação da isenção de pagamento de portagens da ponte de 25 de Abril durante os meses de agosto, enquanto medida de racionalização de despesa, enquadrada no objetivo global de consolidação das contas públicas a que o Estado Português se comprometeu a cumprir».

Confesso que tal medida não me afecta particularmente, porque não vou muitas vezes à praia e não o faço por ter ou não de pagar uma portagem. A medida até então adoptada reflectia mais uma excessiva protecção do Estado em matérias pouco ou nada relevantes. Ao longo de todo o ano tenho de pagar portagens diárias para me deslocar de casa para o trabalho e vice versa. No fim de cada mês a factura é pesada e é mais uma parcela, a par do combustível, a abater ao ordenado. Justo seria repensar os custos excessivos para quem não tem outras alternativas, mais ainda quando se prevêem aumentos de 15% e 25% nos custos dos transportes públicos.

Eu até sou a favor do utilizador-pagador, mas parece-me que o problema não é o pagamento de portagens na ponte 25 de Abril em Agosto, mas sim a racionalização de despesa que é pedida a quem já tem de apertar o cinto o ano inteiro. Parece-me ainda que não é uma questão de justiça social, mas sim de injustiça de princípios. Por fim, penso que convocar um buzinão para a próxima segunda-feira não vai resolver nenhuma das questões fundamentais desta temática, mas antes agravar o início, sempre tumultuoso, de mais uma semana de trabalho. Ainda bem que é Agosto!

terça-feira, 26 de julho de 2011

Queixumes de barriga (literalmente) cheia

Ontem - bom, na verdade, foi há uns minutos, mas os suficientes para que a data fosse outra - escrevi aqui sobre como os telejornais estão cheios de notícias ridículas. E não, já nem me refiro às reportagens cujo único objectivo parece ser triplicar a duração de um noticiário que podia perfeitamente durar 30 minutos. Mas, no meio do absurdo de um número de mortos que se reduziu, surge uma notícia sobre um número de mortos que ameaça aumentar.
Quando era pequenina e não me apetecia comer o resto da sopa (situação rara, devo frisar), os meus pais invocavam as crianças que, em África, morriam de fome - um argumento que muitos, suponho eu, também terão ouvido em circunstâncias idênticas. Eu contrapunha que a quantidade de sopa por mim ingerida não tinha repercussão sobre a nutrição infantil africana (na altura, ainda me era alheio o conceito de derivada). Continuo a achar que é um raciocínio sólido, mas fico consternada quando vejo uma criança somali de 1 ano que pesa 6 kg e está praticamente cega devido à falta de vitamina A e cuja mãe é, aparentemente, uma adolescente.
Isto leva-me a pensar que nos queixamos das agruras da crise de barriga cheia. Literalmente. É claro que também há fome em Portugal e muita miséria, mas convinhamos que não somos referência para meninos pequeninos com falta de apetite. Ver na televisão estas pessoas que só têm olhos, pele e ossos ou ouvir as histórias de uma amiga que viveu na Guiné e que contava que, nos regressos a Portugal, o que mais agradecia era os duches quentes porque a junção "água corrente" com "temperatura elevada" era coisa que ela não tinha em Bissau ajuda a relativizar um pouco as coisas.
Não me interpretem mal! Longe de mim estar a fazer mau benchmarking e a usar a miséria trágica dos outros para me sentir confortável no actual estado de coisas. Não me parece grande conquista ser rei porque se tem um olho numa terra de cegos. Apesar de todos os problemas conjunturais e estruturais, Portugal faz parte do lote de países desenvolvidos e é com eles que se deve comparar. Mais, deve comparar-se com os melhores de entre eles, ainda que o confronto não nos seja lisonjeiro. Mas, de repente, vem-me à memória a pirâmide de Maslow e vejo que o topo não está assim tão longe. Por outro lado, ocorre-me que, neste século XXI, o sector primário é capaz de recuperar algum do protagonismo que a revolução industrial lhe retirou. É que, possivelmente, a designação de primário não será casual.

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Seguro 0 – Coelho (e Marques) 1

Podia ser o resultado de um jogo mas não é. Trata-se de confronto político/partidário e começa agora a disputar-se! Conforme era esperado, Seguro venceu as eleições internas e, não perdendo tempo, criticou a politica do PSD e do Governo. Mas cometeu o erro de efectuar essa intervenção criticando a política de juventude, mencionando que o actual Governo trata a juventude como “jovens a dias”.
António José Seguro definiu a sua estratégia ainda antes das eleições a Secretário Geral do PS quando afirmou: “ Não respondo a ministros do Governo. Quando o Primeiro-ministro falar, aí sim, responderei!” Seguro procurou desta forma assumir-se como candidato a Primeiro-Ministro e foi uma boa estratégia. Colocou-se ao nível do líder do Governo e do principal partido opositor. Era o que lhe competia e foi eloquente na mensagem que passou por via da comunicação social.
Mas Seguro parte com a desvantagem usual dos partidos em renovação e na oposição. E neste caso em particular, cometeu um erro elementar:
E porquê?
Os motivos são 2: Em primeiro lugar porque a actual situação dos jovens é, em grande parte, reflexo das políticas não deste mas dos últimos governos. E embora Antonio José Seguro não fizesse parte dos Governos anteriores, foram os seus “camaradas” que definiram essa politica.
Mas o segundo motivo é mais relevante. Ao criticar a politica de juventude, Seguro possibilitou que a resposta às suas declarações não fosse do Primeiro-Ministro, não fosse de um Ministro ou mesmo da liderança parlamentar do PSD mas sim do líder da Juventude partidária do PSD – Duarte Marques.
Não pretendo aqui analisar as políticas de juventude em Portugal nem identificar culpados mas, nesta matéria específica, Seguro cometeu um erro estratégico que o recoloca ao nível da sua passagem pela JS e não como líder do maior partido da oposição (ou como candidato a Primeiro-ministro). O tema foi mal escolhido e o timming não foi o melhor. Desconheço se a resposta do PSD ao agora líder do PS foi acordada entre Passos Coelho e Duarte Marques (ou até se foi fruto do acaso) mas nesta disputa táctica, não é difícil identificar qual dos dois partidos apresentou a melhor estratégia!

segunda-feira, 18 de julho de 2011

Aproveitar o estado de graça


O Governo está numa posição privilegiada para reformar o país. Para além da maioria parlamentar estável formada por PSD-CDS, a grande maioria dos portugueses ofereceram o voto aos partidos que apoiam as medidas acordadas no MoU (PSD, PS e CDS). Os portugueses entenderam que a situação do país era insustentável e que temos de tomar medidas de contenção com urgência.
O Governo beneficia ainda de um estado de graça natural em períodos pós-eleitorais mas que tem um período de duração limitado e que é infelizmente difícil de estimar.
Aliás, o actual Primeiro-ministro referiu-se explicitamente ao estado de graça no seu discurso de tomada de posse, pedindo aos Portugueses que lhe concedam esse “benefício da dúvida”!
Entre os factores que contribuem para o estado de graça estão a inexistência de uma liderança no principal partido da oposição, o sentimento social de que é necessário mudar o rumo do país e o período de férias dos portugueses. Podemos ainda classificar outros factores como potenciadores do estado de graça no nosso país como a existência de competições futebolísticas ou a divulgação de assuntos mediáticos não políticos.
Mas estes factores não perduram no tempo. O PS vai eleger uma liderança que contestará as medidas do Governo; o sentimento social em prol da mudança diminuirá em função da implementação das medidas de contracção (e será inversamente proporcional à contestação organizada que se espera por parte das diferentes classes sociais e organizações sindicais); e o período de férias terminará em meados de Setembro, assim como o tempo de sol e calor.
Depois desta fase politicamente reduzida em relação à duração de uma legislatura, os cidadãos vão ser mais exigentes e críticos. Vão prestar mais atenção às acções politico-governativas e vão reagir de forma diferente às medidas de reestruturação, mudança ou de contracção económica.
Dessa forma, o Governo necessita de anunciar e implementar as medidas difíceis o mais rapidamente possível. Diria até que as políticas estruturais deverão ficar definidas até final do corrente ano, pois, a meu ver, será esse o timing disponível em que vigorará o estado de graça.
Se o Governo não cometer erros até final de Dezembro, eventualmente esse período poderá ser mais longo. No entanto, com os aumentos previsíveis do desemprego, com a redução do orçamento familiar disponível e a contracção da actividade económica, não perspectivo uma duração mais elevada para esse factor difícil de quantificar mas que é um dos maiores activos que pode ter um Governo recém-empossado.